Dentro da Corporação dos Fuzileiros Navais havia um
EUA diferente. Havia uma fraternidade amalgamada na farda e no fuzil que
extrapolava os problemas de raça, casta e local de nascimento que assolava a
população civil. Lá eles eram poucos, lá eles eram escolhidos a dedo. Lá eles
eram fiéis uns aos outros e acima de tudo, lá eles eram irmãos.
Bino somente podia passar o final de semana em casa e
andava sempre exausto e sobressaltado. E isso aborrecia Cindy ainda mais. Ela
não queria saber da história de camaradagens entre os Marines e não queria
conhecer os seus amigos de farda. E isto afetava ainda mais a normalidade do
casamento, mas ambos pediam a Deus para a chegada do final da guerra - que
parecia estar se aproximando. Nixon proclamava que o fim da guerra estava perto
e o número de tropas no Vietnam continuava a cair. Os bombardeiros B-52
lançavam uma chuva de bombas de todos os tipos no Vietnam do Norte e o Vietcong
se refugiou em Camboja
*
* * * * *
Mas esta movimentação militar para o Camboja criou um
surto militar exigindo mais botas atuando no conflito - e Bino foi mandado para
o Vietnam.
Deste período pouco se sabe, pouco foi falado. Mas uma coisa é certa: algo de muito ruim
aconteceu por lá – e ao retornar da guerra Bino nunca mais falou sobre esse
assunto.
Ele serviu trezentos e vinte e quatro dias e sete
horas. Ele não estava bem e procurou ajuda com Jerome Moore, ex-sargento do
Bino, veterano Marine que servia seu terceiro turno no Vietnam. Já havia se
tornado um viciado em adrenalina, Jerome parecia a ter dependência química de
guerra.
Jerome reportou aos superiores que o Cabo Tedesco
necessitaria de uma “descompressão” de estresse de combate, antes de voltar a
vida civil e assim foi feito: Bino retornou a Los Angeles via Alemanha.
Lá ficou no LAMARC, ou Landstuhl Centro Médico
regional em Rheinland-Pfalz, para uma desintoxicação. O colocaram num programa
de reabilitação chamado "cold turkey", ou seja, foi colocado
numa cela estofada, lhe davam muito sedativo, e obviamente nada de álcool ou
drogas. Uma parada completa e total.
Bino pensou que ia morrer e fingiu que estava parando
de beber para não morrer no tratamento. Quinze dias depois, sob tranqüilizante
ele foi recambiado com outros soldados aos EUA, para mais tratamento em regime
semi-aberto no Hospital de Veteranos Militar em Los Angeles indo depois ele a
morar temporariamente com o Jerome
Do Vietnam ele trouxe poucas coisas boas e umas
conclusões pessoais das quais umas faziam sentido e outras eram tanto
esdrúxulas: concluiu que “todas as guerras são estúpidas e deveriam ser lutadas
pelos políticos e seus filhos – e assim não haveria mais guerras”.
Bino tornou-se irritadiço com o Zé-povinho agitador de
bandeiras em demonstrações cívicas e sempre dizia: “patriotismo de guerra é
coisa de idiotas.”
Também voltou da guerra afirmando que “ninguém luta
por um país ou causa. Se luta pelos irmãos do pelotão, pelo irmão chafurdado
numa trincheira, ou sob fogo do inimigo”. Também dizia que “patriotas
aguerridos” que não participaram de guerra “era um bando de babacas e covardes,
masturbadores mentais que gozam com o pinto dos soldados.”
Só no Vietnam Bino descobriu o significado da tatuagem
do Alabama Steve: Era a marca registrada da Primeira Cavalaria Aérea, e seu
característico Az de Espada da Morte a ser colocado nos bolsos, sobre,
ao lado ou de preferência na boca do Vietcong morto - para espalhar o terror
entre o inimigo.
As iniciais D. F. A era o moto da Cavalaria Aérea: Death
From Above, “Morte Vinda de Cima”. A Air Cav também fazia parte da
Guerra Psicológica, composta na maioria de guris pirados, Muitos voavam seus
helicópteros, pulverizando as capoeiras com fogo intenso de suas metralhadoras,
derrubado árvores com seus mísseis e crivando de balas qualquer ser humano que
corresse debaixo dos helicópteros vestidos de pijamas negros
Na guerra ele também começou a entender a cabeça do
amigo Alabama Steve e as suas constantes loucuras, seus excessos quase suicidas
e seu descaso pela vida.
À medida que as baixas americanas cresciam, a
retaliação da Morte Vinda de Cima ia ficando cada vez mais feroz - e
democrática: Matava-se a todos e a tudo indiscriminadamente. Das vacas, aos
cachorros; do velho ao jovem que pareciam ser Vietcong. O Marine ou
soldado recém chegado ao Vietname achavam a Air Cav indisciplinada e
cruel. Mas os veteranos sabiam que eles muitas vezes eram a salvação de um
Pelotão ou Companhia. Quando cercados por inimigo além do alcance dos canhões
navais, em locais inacessíveis para tropas mecanizadas, ou bombardeio de
aviação, havia sempre um último recurso para o resgate: Era a Cavalaria Área,
com seus loucos e suicidas, arriscando - e muitas e muitas vezes perdendo - as
suas vidas para salvar os soldados sitiados.
Entre eles as baixas eram altíssimas e a morte por
suicídio e drogas era comum. Muito de seus helicópteros tinha alto-falantes que
tocavam de músicas clássicas a rock and rolls – dependendo do oficial no
comando, do local ou da combinação de droga e álcool usada por alguma pessoa em
um determinado dia.
A frustração dos soldados era imensa. Ao final da guerra,
em Saigon não se podia confiar nem na própria sombra. Crianças armadas de
explosivos plásticos ou com caixas de engraxate carregadas de explosivo mataram
muito guri recém chegado, cheio de compreensão e amor pela humanidade. A
população rural vivia coagida entre as tropas americanas e o Vietcong. Se eles
ficassem neutros eram mortos pelo Vietcong como colaboradores. Se pegassem em
armas para não serem tido como colaboradores, imediatamente se tornavam
Vietcongues e a eles chegavam à morte: Por bombas Napalm, pelo chão pelo mar e
pelo ar.
*
* * * * *
Depois do Vietnam, Bino nunca mais foi o mesmo. Ao
procurar seu lar, este não mais existia e Cindy havia sido despejada e havia
desaparecido. Bino foi morar em Redondo Beach com o Jerome, seu ex-sargento que
havia regressado a Califórnia dois meses antes - após cumprir o seu terceiro
turno no Vietnam.
Eles dividiam a despesas no apartamento enquanto Bino
procurava um lugar para si próprio.
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